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domingo, 31 de julho de 2016

"Em Jeito de Diário" - parte 3 de 3 (final)


Demorou tempo até deixar de colocar as prioridades de quem não merece, à frente dos meus próprios desejos mas, confesso que foi necessária muita força de vontade e uma ou duas mensagens amigas, de incentivo, concordância e apoio.

Lá está a Amizade outra vez. Que coisa bela!

Como é possível que tais palavras de conforto cheguem de quem menos convívio tinha? Afinal… são lindos os mistérios desta vida.

Olho alguns meses para trás, e percebo finalmente o que esta recém-adquirida liberdade de compromissos sentimentais me trouxe. Presenteou-me com a oportunidade de trocar umas primeiras e simples palavras que deram origens a amigos sinceros. Agora sim, posso dar largas a sentimentos mais puros, sem ter por cobertura a sombra da desconfiança iluminada por vezes pela fraca luz da anuência.

Se a vida corre bem? Claro que não! Nunca corre… há sempre algo que podemos melhorar. Mas tenho agora o vislumbre de um futuro que, embora incerto, está à espera, no final de uma estrada longa e sinuosa, mas longe dos terrenos planos e sedutores do passado, que ostentavam falsidades e ocultavam armadilhas por cada metro percorrido.

E pronto… mais uma folha de um guardanapo de papel escrita, que acabou por se transformar em duas, depois em três… e acabei por terminar o resto desta história em frente do computador.

Se terei mais para contar? Se foi realidade ou ficção? Quem sabe…

Deixo-vos com uma frase do grande “Pessoa”: "Eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos!"

"Em Jeito de Diário" - parte 2 de 3


A caneta continua a escrever, enquanto a fútil tentativa de sentir raiva dá origem a um sorriso.

«Talvez fosse melhor assim.» – Repito para mim baixinho. Mas o coração ainda não me deu provas do que a lógica tem como certo. – «Como é possível, depois de quase uma década de amena estabilidade, a vida dar tantas voltas num espaço de tempo tão curto?»
Olho para estes últimos dois anos, com os seus altos e baixos, acarretados com problemas e alegrias. Lembro-me dos usuais convívios, cada vez mais espaçados no tempo, dos contactos com amigos, cada vez mais raros, de novos conhecimentos e amizades que a pouco e pouco foram surgindo…

Amizade… Palavra estranha, essa.

Dou por mim novamente a sorrir.

Afinal, os amigos dignos desse nome a que eu dou, talvez, mais importância que a palavra “Amor” (usada agora por tudo e por nada em qualquer reles telenovela) continuam a sê-lo. Sinto por vezes a sua tristeza nas poucas conversas que temos, pois um verdadeiro amigo também tem o direito de ficar triste quando não nos vê felizes, e mais ainda, quando se vêem quase obrigados a fazer escolhas impossíveis em prol de um ambiente mais salutar, onde os ciúmes de um, se sobrepõem à vontade de muitos.

sábado, 30 de julho de 2016

"Em Jeito de Diário" - parte 1 de 3


Aqui estou eu, novamente a rabiscar algumas palavras nas pequenas folhas amarrotadas de um guardanapo, sentado exactamente na mesma mesa de esplanada onde por tantos anos desfrutei de uma companhia que pensava ser eterna.

Olho para a cadeira vazia a meu lado, e as imagens dos tão belos momentos que passamos juntos, entre conversas e olhares de cumplicidade, passam por mim a correr como num antigo filme mudo, ainda a preto e branco. Sem dar por isso, já passou um ano… Dois anos... Três... Não consigo conter uma lágrima que teimosamente insiste em querer vir espreitar o sol deste final de tarde.

«O tempo passa a correr.» – Penso para comigo.

A ténue linha entre a felicidade e a tristeza enrola-se na minha mente em voltas complexas, tal como a mais elaborada renda de bilros, onde apenas podemos apreciar a complexidade e beleza do resultado final, mas é impensável até para o olhar mais atento e treinado, distinguir todas as suas voltas e contravoltas. 

Em vão, tento forçar-me a pensar nos momentos menos bons que passámos, e sinto-me frustrado ao constatar que apenas as boas recordações ficaram.

terça-feira, 5 de julho de 2016

Pedido Impossível...


A noite findou e, a madrugada nasceu sem um sorriso.
Indaguei… Perguntei… Por dias e meses chorei…
Mas finalmente sei o porquê.
O porquê da distância ser cada vez maior…
O porquê das palavras já não aquecerem as manhãs frias de inverno…
O porquê de não ouvir no teu pensamento a palavra Amor.
E... Agora que sei… Caem lágrimas por um rosto que já não espera sentir novamente o calor do teu sorriso.
E… Agora que sei… Foi minha a culpa.
Chama-lhe ingenuidade… Credulidade… Confiar demais numa pretensa amizade…
Chama-lhe o que quiseres… Não estás longe da verdade!

A tarde terminou e, as trevas avizinham-se longas e melancólicas.
Contenho em mim explicações que não pedes sobre um assunto encerrado e, enterrado sob as questões que nunca quiseste colocar.
Retraio muito a custo a vontade de te enviar mil beijos no vento, cada um deles levando um pedido impossível banhado numa lágrima:
Desculpa, eu te peço!
Mas… Eu sei. Eu sei que até as palavras mais frias e distantes ofertadas… Nem essas eu mereço!

Começa o dia e, o sol agracia-me com a recordação do teu olhar.
Sinto-me feliz com a singela retribuição de um carinho mas, guardo para mim essa realidade quase certeira de momentos únicos que dificilmente se repetirão.
Eu sei… Eu sei que, por mais que pese no coração, por mais que tente... Há erros indeléveis impossíveis de apagar mas, prefiro mil vezes fechar os olhos para sempre do que, por um ínfimo segundo apenas, falhar contigo… Novamente!

sexta-feira, 1 de julho de 2016

"Reencontro"

arte por, Leonid Afremov

Cheguei, finalmente.
Os teus olhos recebem-me com o brilho característico da alegria e da saudade. A ânsia de um beijo proibido é parcamente atenuada por um cumprimento mais formal:
“Olá. Como estás?”
As nossas mãos tocam-se num gesto involuntário e a vontade de te arrastar pelo braço daquele local público e te guiar até à privacidade do quarto, acende-se em mim como um farol.
«Será que alguém percebeu?» – Penso para comigo.
Tento disfarçar, mas quando o meu olhar se cruza com o teu naquele instante que parece durar uma eternidade, não consigo conter um sorriso e sinto a inevitável cor rubra formar-se no rosto.

Estavas a pensar o mesmo… Não chegaríamos ao quarto!

O silêncio momentâneo e fictício, volta a dar lugar ao burburinho característico do café. Dirijo-me ao balcão depois de cumprimentar distraidamente os outros ocupantes da mesa, mas não resisto a passar a ponta dos dedos pelos teus cabelos numa caricia dissimulada.
A espera antes de ser atendido, contribui com o tempo necessário para controlar os pensamentos, mas o desejo… Esse aumenta a cada passo que dou na tua direcção.

A noite continua, entre conversas alegres, banais, e assuntos mais tristes. Opiniões são dadas… Comentários feitos… Os minutos transformam-se rapidamente em horas e, entretanto, está na hora de ir.

Não foi hoje, nem será amanhã. Talvez para a semana... ou talvez até nunca venha-mos a ter o prazer de saciar o fogo dessa paixão quase impossível, ateado nas labaredas de um primeiro olhar.
Mas… Eu nunca gostei da palavra “nunca”.

Levantamo-nos, e começa a sucessão de cumprimentos, agradecimentos e votos de boa viagem.
Tu ficas para o fim.
As palavras de despedida fluem num abraço informal mas, quando as nossas faces se tocam, é impossível resistir a trocar a suave caricia de um beijo.
“Um dia…” – dizes-me baixinho ao ouvido.
“Sim…” – respondo. – “Pena esse dia não ser já hoje.” 

 Os nossos braços separam-se, renitentes e, enquanto me afasto e deixo em voz alta um último “Boas noites”, adivinho o teu pensamento a proferir baixinho:
«Quero fazer amor contigo!»
Olho para trás…
«Eu também.»

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H. Vicente Cândido, 1 de Julho de 2015