– Vá lá, não sejas assim. Olha a
praia ali em baixo a chamar por ti. – Respondeu, enquanto com a mão livre gesticulava
em direcção à janela do restaurante. Mas a esposa mantinha-se firme.
– Nem penses. Concordei mais uma
vez que adiasses o descanso, mas… Eu jurei a mim mesma que ia passar estes
quatro dias contigo, e é o que pretendo fazer, quer tu estejas a trabalhar ou
não.
– Mas… – Voltou Miro a tentar
argumentar, mas sabendo perfeitamente que não ia conseguir convencer a mulher a
mudar de ideias. – Pode ser perigoso.
– Mais uma razão para eu ir
contigo. Se te acontecer alguma coisa, desta vez quero estar por perto.
– Mas… Os regulamentos… – Tentou
outra vez.
– Os regulamentos não se aplicam
a quem está fora de serviço. – Replicou, com um tom de advogada. – E, que eu
saiba, tu vais ajudar mas continuas de folga. Portanto, eu vou contigo, quer tu
queiras quer não.
Miro viu-se sem capacidade
argumentativa face à esposa.
Pensou durante alguns segundos.
Afinal, ia ser apenas uma simples
operação de busca e resgate, e ele ia ficar apenas como consultor e observador.
A taxa de perigo seria mínima, pelo que não havia motivo para que Ofélia não o
acompanhasse.
– Pronto! Certo! Vens comigo, se
isso te deixa satisfeita. Mas, vamos deixar os homens fazer o trabalho deles
sem interferir, o.k?
– Tu mandas, amor. – Respondeu
ela, espetando-lhe um repuxado beijo na boca.
Miro sorriu, finalmente tendo
liberdade para se levantar. Sim, ele mandava mas, acabava sempre por fazer
todas as vontadinhas à esposa. Só esperava, desta vez, não acabar por se
arrepender.
Por sorte, um dos barcos que
levavam os turistas no percurso pela orla marítima da ilha, acabava de chegar à
plataforma de desembarque deixando em terra quatro passageiros. Uma rápida
conversa com o barqueiro para acertar o preço, e encontravam-se novamente a
deslizar na ondulação do atlântico.
Foi exactamente meia hora o tempo
que demoraram, desde a saída do restaurante até à chegada ao forte.
Estavam a subir as escadas de
acesso ao pátio quando, ao longe, o zoar do motor de um helicóptero começava a
destacar-se do barulho da rebentação das ondas. Dois minutos depois, uma aeronave
cinzenta, pousava mesmo no centro do pátio exterior do forte, perante o olhar
espantado de meia dúzia de turistas que se abrigavam das rajadas de vento
produzidas pelas pás do aparelho e, refugiados entre os portões, tentavam com
as mãos sobre os ouvidos, abafar o barulho.
Ainda as portas laterais do helicóptero
não estavam completamente abertas, já sete indivíduos uniformizados saltavam
para o chão, afastando-se das hélices e alinhando-se em formatura com uma
precisão e prontidão típica de anos de treino militar.
Tão rápido como chegou, a
aeronave levanta voo, desaparecendo por trás da ilha na direcção oposta à que
chegou, deixando seis homens de camuflado e capacete com viseira à prova de
balas, alinhados em paralelo à espera de ordens de um sétimo que, em frente
deles, alinhava um bivaque azul sobre a cabeça, acabando por deixá-lo inclinado
de mais com a ponta quase a tocar a sobrancelha esquerda.
Quando decidiu que o chapéu já
lhe deveria estar a cobrir convenientemente a ligeira calvície que se começava
a notar, gritou algumas ordens imperceptíveis para o grupo de homens em sua
frente enquanto perscrutava rapidamente todo o recinto, como se procurasse
alguém.
Miro tomou a iniciativa,
avançando para o pequeno pelotão.
– Oldemiro Mendes. – Apresentou-se,
estendendo a mão.
O oficial virou-se, fazendo uma
rápida continência e, por sua vez, cumprimentando-o também com um aperto de
mão.
– Tenente Samora, inspector
Mendes. O comando enviou-me, a mim e a estes homens da unidade de busca e
resgate, e deu-me ordens para ficar à sua inteira disposição. Apenas recebi as
coordenadas, uma breve descrição da situação e o seu contacto. – Enquanto
falava, mantinha-se rígido, quase imóvel e com uma expressão um pouco
carrancuda demais, como se não estivesse muito à-vontade por ter que se
rebaixar a alguém que, muito provavelmente, não tinha metade da experiência
dele em situações idênticas. – Aguardo as suas ordens!
A voz do tenente Samora era encorpada
e as palavras surgiam rápidas e com curtas pausas, como para se certificar que
todas as sílabas eram entendidas na perfeição. Com perto de um metro e oitenta,
ombros largos, porte atlético, cabelo curto começando já a ficar acinzentado
aqui e ali, fazia lembrar o chefe de pelotão de um filme de comandos
americanos.
Enquanto falava, os seus homens,
– estes com uma aparência bastante mais jovem, talvez rondando os vinte, vinte
e cinco anos – ouviam em silêncio sem mexerem um músculo, com uma reverência de
quem está habituado a receber ordens de um superior. Para eles, o tenente
Samora não era apenas o seu líder. As dezenas de missões por onde já tinham
passado juntos, inclusive em países como o Iraque, tinham nutrido neles uma
profunda admiração e respeito por aquele homem, uma pessoa a quem estavam
preparados para seguir até ao fim do mundo.
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